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BIG BROTHER BRASIL E O COMPLIANCE TRABALHISTA

Você pode não gostar e não assistir ao programa Big Brother Brasil, mas tenho certeza de que sabe o que acontece lá dentro que causa tanto burburinho. Câmeras nos banheiros, provas de resistência, “monstro”, incentivo da direção pela competitividade excessiva, assédio moral, relacionamento entre participantes, briga por comida, briga por cama, briga por qualquer outra coisa.

Desde o início do programa, foram feitos grupos de pessoas que procuravam através da força impor os seus pensamentos, enquanto outros perderam a voz e não sabiam como serem ouvidos. Foi mostrado ainda um assédio moral nunca visto em um reality show, e uma negligência evidente dos diretores do programa.

“Aqui não é instituição beneficente: se não aguenta o ritmo, cai fora. – É bom fazerem o que estou mandando. ‘A fila de desempregados aí fora é grande e estão torcendo para abrir uma vaga.’

‘Vou fazer ela pedir pra sair, ou vai ter que aguentar. (sic)’

‘Pede pra sair. Vai ter que me engolir” (sic)

Tomando o programa como base, pergunto, e se o Big Brother fosse uma empresa?! Parece difícil associar o que acontece lá dentro com o que acontece dentro das empresas, mas não se engane, apesar de não parecer, ocorre com uma frequência que não imaginamos. O programa é um ótimo comparativo de como funciona uma empresa que não possui um controle e preocupação maior de seus participantes e diretores e principalmente a falta de Compliance.

Se pensarmos no começo do programa, ao se fazerem grupos, ocorre uma polarização de ideias, e normalmente sempre existem pessoas com maior habilidade em falar e convencer, sem contar o espírito de liderança imposto, enquanto outras não conseguem se fazer ouvidas as vezes por timidez, as vezes por receio. E ainda, existem aquelas pessoas que pedem para sair por não aguentarem a pressão a que são submetidas.

Por mais que os gestores não tomem conhecimento direto do que ocorre, eles são responsáveis pelos atos de seus participantes (funcionários), já que possuem o dever de conhecer e saber tudo o que acontece no programa (empresa), além do dever de proporcionar um ambiente (de trabalho) seguro e sadio.

Mas onde o programa entra nisso?

Fazendo um comparativo com as atitudes que ocorrem dentro da casa, podemos verificar situações em nosso dia a dia dentro de uma empresa.

A cultura de uma empresa depende diretamente da sua alta gestão (CEO, diretores etc.). Eles são o espelho de seus funcionários e a forma que dirigem a empresa impacta diretamente na ação de todos os seus colaboradores em todos os níveis daquela empresa.

Um ponto bastante controverso, mas que ocorre em algumas empresas é a existência de câmeras em banheiros e vestiários, além do controle da quantidade de vezes em idas ao banheiro, a obrigação de trabalhar em pé durante toda a jornada de trabalho, com restrição inclusive para se sentar, reprimendas e humilhações, entre tantos outros absurdos.

Aqui não resta dúvidas acerca da arbitrariedade perpetrada pela empresa. A existência de câmeras em sua dependência não é proibida, contudo, no banheiro ou vestiários em que ocorre troca de roupas ferem diretamente a dignidade do trabalhador. O controle de idas ao banheiro, a exigência do trabalho em pé, são extremos que a empresa não pode cobrar, já que seriam exatamente uma prova de resistência dos trabalhadores, que são obrigados a chegarem ao seu limite físico, o que também feriria a sua dignidade, além de poder causar doenças relacionadas ao ambiente de trabalho.

O programa também exemplifica de forma magistral a questão da competitividade extrema. Infelizmente um ambiente de extrema competitividade entre os funcionários pode existir a ponto de um “passar a perna” no outro. Aqui a concorrência deixa de ser saudável para chegar a um ponto em que as relações internas da empresa se tornam nocivas, tudo em busca de um “prêmio”. Temos ainda situações de brigas por bens comuns da empresa, por “atenção”, relacionamentos impróprios, entre outros.

Agora, um dos momentos mais expressivos que vimos no programa, foi a questão do assédio moral. Infelizmente o assédio moral não é algo tão distante da realidade, sendo que sem uma intervenção direta da alta gestão, ocorre de forma corriqueira no ambiente de trabalho.

“É bom fazer o que estou mandando, senão já sabe. A porta da rua é serventia da casa. – Eu vou fazer o manicômio dela, vou fazer ela pedir pra sair.’ (sic)

‘Vai aprender na marra, na tortura”. (sic)

O empregado as vezes sofre uma pressão psicológica tão grande, que pode ser feita pelos seus supervisores ou até mesmo de colegas, a ponto do ambiente se tornar tão tóxico, que o colaborador não consegue suportar a situação e pede para sair da empresa. Algumas vezes a pressão dentro de uma empresa não chega a ser tão escancarada, mas são suficientes para que funcionários não resistam e cedam a pressão pedindo demissão da empresa.

Aqui novamente vemos a necessidade da cultura da empresa junto aos seus funcionários e a forma com que esta empresa lida com as denúncias recebidas.

É necessário que exista uma formalização entre a reclamação do funcionário e a empresa, no caso, um canal de denúncias em que os funcionários se sintam a vontade para denunciar algum ato sem o medo de alguma represália. A partir dessa denúncia a empresa deverá proceder uma investigação interna para comprovar ou não o ato denunciado e assim tomar as providências que entender cabível.

Por outro lado, com um código de conduta e um regulamento interno, diversas situações poderiam ser evitadas: o relacionamento entre colaborares durante o horário de trabalho, relacionamento entre superiores e subordinados, a contenção de brigas por qualquer bem de uso comum da empresa, a competitividade extrema em que se incentiva “brigas” diretas entre colaboradores, assédio moral, entre outras diversas situações.

“Eu mandei e você tem que fazer! Manda quem pode e obedece quem tem juízo! – ‘Não quero que fale comigo quando estou na mesa comendo, obrigada’.

Boicoto seu trabalho e suas comunicações interrompendo sempre seu trabalho e seus contatos para desestabilizá-lo. – ‘Ele tá falando alguma coisa? Porque, assim, eu vou jogar água na cara dele.” (sic)

Sem o regulamento e o código de conduta como poderia ser cobrada qualquer ação dos funcionários que não fossem efetivamente ilegais, mas que não são aceitáveis pela empresa? Importante lembrar que o que não é proibido, é permitido.

O Compliance trabalhista que seria uma gestão de riscos é a prática de adequação e possui a finalidade de organizar a empresa para que alta gestão, funcionários e até mesmo terceiros saibam como agir e o que fazer em cada caso. Com o Compliance, mesmo se essas situações ocorressem na empresa, os supervisores e diretores saberiam como agir para fazê-las cessar e teriam a confiança necessária nas decisões tomadas.

O Compliance é uma cultura, ou seja, não pode ser mudada de forma repentina, é um trabalho diário tanto para funcionários quanto para alta gestão. Ou seja, o comprometimento de todos os colaboradores da empresa, do topo à base, é essencial para que as mudanças sejam implementadas e essas situações descritas não se tornem corriqueiras ou passem despercebidas na empresa.

      Laura Correa Rocha

Advogada Trabalhista Empresarial

Compliance e LGPD Trabalhista